quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

Os filhos de Aia

 

Os filhos de Aia


“O fato é que nós não apenas podemos

 controlar o comportamento  humano, nós devemos”

Skinner in Walden II.

O título desse artigo é originado do romance de Margaret Atwood (O Conto de Aia), onde o personagem principal, Aia, tem como primordial objetivo procriar e servir. Caso quebre as regras impostas poderá sofrer punições ou ser exterminada.

Trazendo esse romance distópico para os nossos dias e observando os sofisticados avanços da psicologia behaviorista fundamentados nos estudos de Frederick Skinner e amparados nas tecnologias de telemetria desenvolvidas por Struart Mackay, quando estudou o comportamento dos animais.  Paradoxalmente percebemos que a estrutura humana pode ser manipulada e condicionada em suas escolhas e atitudes!

Agora, todo esse arsenal oriundo da psicologia comportamental, atrelado à telemetria e computação ubíqua (em qualquer lugar e a qualquer tempo!), produziu uma poderosa ferramenta para a manipulação e controle da população. Uma pequena amostra pode ser extraída dessa grande experiência de controle social produzida durante a pandemia do SARS-CoV-2 que continua em processo.

Na medida em que as tecnologias evoluem, mais e mais sensores são embarcados nos mais diversos aparados eletrônicos que nos circundam: relógios de pulso, banheiras de hidromassagem, vasos sanitários inteligentes etc. etc., tudo com um objetivo único: conhecer e controlar todas as nossas ações, de tal ordem a sintonizar nossas escolhas de acordo com interesses pecuniários ou mesmo políticos!

Como explica Zuboff (2020): “numa linguagem comportamental, as situações sociais já estão sempre carregadas de intervenções para sintonizar; a maioria delas, operando fora da nossa consciência”. Por exemplo, um incentivo para renovação automática de uma apólice de seguro veicular com um alerta sobre a perda do prazo de renovação.

Técnicas bastantes sutis vem sendo utilizadas, entre elas: “sintonizar” que pode acontecer de várias formas e destina-se a criar pontuações para, de forma subliminar, moldar o comportamento do indivíduo no exato momento em que ele define uma escolha. “Pastoriar”, cujo objetivo é controlar elementos essenciais e assim, permitir, através de situações previamente orquestradas, levar o indivíduo em direção à determinada escolha. “Condicionar” que tem por finalidade induzir a uma mudança de comportamento. Aqui vale lembrar do experimento de Skinner quando condicionou pombos a bicarem o recipiente de alimentação para receber o alimento!

A percepção desse comportamento é verificada nos usuários do aplicativo do WhatsApp ou Facebook, por exemplo, quando, de forma compulsiva, a cada instante, retorna ao aplicativo para verificar se existem novas mensagens ou “curtidas”! Só para exemplificar, dados de 2016 mostram que um adulto checa seu celular, em média, trinta vezes por dia, enquanto os denominados “milennnial” o fazem cento e cinquenta e sete vezes por dia! (Klein, M – op.cit Zuboff 2020).

Como explica um cientista de dados do Vale do Silício: “quando usam nossos aplicativos, capturamos e identificamos o comportamento dos usuários” (op. cit. Zuboff).

E mais, estados emocionais podem ser transferidos via contágio, levando as pessoas a vivenciar as mesmas emoções de outrem, sem ter consciência disso, podendo afetar seu comportamento fora da rede! Basta refletir sobre os “linchamentos” que verificamos em determinadas situações do nosso cotidiano.

Ai mora o perigo!

Por exemplo, o Facebook possui tecnologia avançada para modificar comportamentos e opiniões, e opera nesse processo de forma “livre, leve e solta das amarras jurídicas”!

Pesquisadores de mobilização política descobriram técnicas de manipulação de pontos vulneráveis dos usuários das redes sociais. Usando sofisticados aparatos tecnológicos,  manipulam situações, induzindo escolhas e tomadas de decisões!

E assim, nosso livre arbítrio passou a ser devidamente manipulado! Nesse “jogo” somos os grandes perdedores, quando imaginarmos que nossas escolhas são oriundas das nossas reflexões; quando na verdade elas são induzidas através de algoritmos bem estruturados que tomam como base, o massivo volume de dados que geramos ao disponibilizar a nossa conduta nas redes sociais e aplicativos dos mais diversos.

O grande alerta que venho comentando é que já passou da hora de colocar um freio nas BigTechs ou correremos seríssimos riscos de enveredarmos em um totalitarismo tecnológico!

Fonte:

Zoboff, S - in A Era do Capitalismo de Vigilância - Editora Intrinseca (2020).

Kaiser, B. in Manipulados - Editora Harper Collins ( 2019).

Souza, J.; Avelino,R; da Silveira, S - in A Sociedade de Controle - Manipulação e Modulação nas Redes Sociais - Editora Hedra (2018).

O´Neil, C. in Algoritmos de Destruição em Massa - Editora Rua do Sabão (2020).

Atwood, Margaret - in O Conto de Aia - Editora Rocco (1985).




 

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