sexta-feira, 28 de abril de 2017

Cadeias Globais e Resiliência Sistêmica.

CADEIAS GLOBAIS E RESILIÊNCIA SISTÊMICA

Em postagem anterior de 27/01/2017 tratamos nesse blog das questões relacionadas à globalização dos mercados e dos riscos logísticos advindos dessa globalização.

Nesta postagem vamos abordar algumas estratégicas importantes que as empresas precisam adotar objetivando criar um escudo protetor e planos alternativos para que elas possam, após sofrer um dano eventual que lhe cause uma interrupção temporária (ver artigo sobre os riscos logísticos), tenha a capacidade de retornar às suas operações.


Vale registrar que muitos autores confundem vulnerabilidade com risco. Há que se considerar numa análise mais detalhada esses dois conceitos. Numa definição clássica, risco é a probabilidade de ocorrência de um evento fortuito, enquanto que a vulnerabilidade pode ser definida com a maior ou menor exposição ao risco, em face da incapacidade implícita ou explicita de criar proteções para a ocorrência de um risco.

Para melhor elucidar o conceito, imaginemos uma situação em que um ciclista se movimenta em uma avenida, na qual não existe ciclovia. É claro que o ciclista, embora se mantenha consciente de eventuais riscos, ele está muito mais vulnerável do que um motorista que trafega na mesma avenida.

Um dos casos emblemáticos da interrupção da cadeia de suprimentos aconteceu com o desastre provocado pelo tsunami no Japão que atingiu os reatores da usina nuclear de Fukushima. Esse acidente provocou efeitos devastadores em muitos fornecedores e no que se refere ao setor automobilístico, a montadora Toyota foi afetada com perdas da ordem US$ 3.5 bilhões, assim como muitos de seus fornecedores, como mostra a figura 2.  
Figura 2 – Custos do Tsunami em Fukushima para as principais montadoras japonesas.
Fonte: Harrington, L. – in Operações Enxutas e Resilientes – DHL (2013).
A capacidade de uma cadeia de suprimentos retornar à suas operações, após ter sofrido um evento inesperado, é comumente denominada de resiliência.
A resiliência é um conceito oriundo da física, quando trata da propriedade de alguns materiais que, acumulando energia, quando exigidos ou submetidos a estresse, não sofrem ruptura. Após a cessação desse estresse, poderá ocorrer algum dano, cujo resultado será uma deformação residual.

Um exemplo típico de material resiliente é o elástico ou mesmo, uma vara de salto em altura, que após sofre um estresse, na medida em que o atleta a exige, não quebra e retorna à forma original.

De uma forma geral, podermos definir a resiliência de uma cadeia de suprimentos como a capacidade dessa cadeia manter suas operações após sofrer um ou mais eventos inesperados.

Assim, dotada de resiliência, uma cadeia de suprimentos permitirá que, mesmo sofrendo um risco que venha a produzir uma interrupção temporária em sua operação, terá capacidade de, rapidamente, retornar as suas atividades de forma a garantir o fluxo de bens e serviços, em todo o espectro dessa cadeia.

Importante ressaltar que ao aumentar a resiliência de uma cadeia, em muitas situações, será necessário criar alternativas ou mesmo alocar a essa cadeia de  suprimentos recursos adicionais, como por exemplo, um plano alternativo. Esses incrementos resilientes poderão resultar em acréscimos nos custos e, nesse sentido, é importante fazer uma análise bastante detalhada das alternativas e os seus impactos, examinando as alternativas sobre a ótica de uma análise de “trade-off” ou trocas compensatórias.

De um lado, no que se refere ao fluxo de bens que circulam na cadeia física, várias estratégias podem ser adotadas com objetivo de manter esse fluxo, como por exemplo: diversificação da rede de fornecedores, disponibilidade de manufatura alternativa (unidades menores e distribuídas em função da demanda) para a fabricação do produto, estoque de segurança, alternativas de transporte com opções de operadores logísticos etc.

De outro, devemos considerar também o suporte da Tecnologia da Informação (TI) nos processos logísticos e sua capacidade de facilitar o gerenciamento da cadeia e, por via de consequência, permitindo sua visibilidade, estar preparado para a ocorrência de eventuais fatores adversos.

Dentro de uma nova abordagem que integra inclusive a Internet das Coisas (IOT), esse suporte de TI à logística envolve hoje a denominada Cadeia Digital, que engloba tanto o fluxo informacional quanto os equipamentos de apoio que permitem realizar o controle dos processos durante o fluxo físico de bens que circulam na cadeia de suprimentos. 


Figura 3 – Cadeia Digital de Suprimentos
Fonte: The Center of Global Enterprise (dez – 2015)

Uma definição bem adequada para Cadeia Digital de Suprimentos foi fornecida pela CGE - Center of Global Enterprise, que a conceitua como um modelo de plataforma digital centrada no cliente que tem por finalidade capturar dados em tempo real e maximizar a utilidade dos dados capturados nas mais diversas aplicações (previsão de demanda, gerenciamento dos pedidos, gestão dos estoques, gestão do sistema de transporte etc).

A figura 3 apresenta a concepção da Cadeia Digital de Suprimentos com seu enfoque no Consumidor, enquanto que a figura 4 mostra a estrutura dessa Cadeia Digital e sua integração com os modelos de negócios.



Figura 3 – Estrutura da Cadeia Digital de Suprimentos
Fonte: Kearney/WHU Logistcs Study (2015).

Como mostramos em nossa postagem anterior (Manufatura Global e Cadeias de Suprimentos - 27/03/2017), um exemplo de plataforma digital é a utilizada pela Li & Fung Ltda. que opera com uma estrutura digital denominada TRIGANT que se conecta à toda a rede de suprimentos, permitindo assim o seu completo gerenciamento.

Essa nova plataforma – Cadeia Digital - tem a possibilidade de utilizar a Internet das Coisas, o Big Data e AI com objetivo de gerenciar a cadeia de suprimentos; como também analisá-la sobre os aspectos de riscos logísticos e, nesse caso, decidir mediante modelagem ou mesmo emitir sinais de alerta para que sejam tomadas medidas corretivas. Em muitos casos, o próprio sistema utilizando-se da análise de alternativas, busca mitigar os riscos dos processos envolvidos, produzindo importantes relatórios e informes situacionais para a tomada de decisão.

É evidente que um dos maiores riscos na operação dessa plataforma é a possível invasão por hackers. Essa violação de segurança por criminosos envolve vários objetivos fraudulentos e até mesmo furto de mercadorias. Nesse sentido, o uso de tecnologias avançadas de proteção contra cyber ataques ou mesmo utilizando-se a possibilidade de realizar as transações via block chain , são alternativas de segurança que permitirão aumentar a proteção à rede de dados. Aqui vale um registro de uma ditado emblemático que poderá ser estendido à rede de dados: " O preço da liberdade é a eterna vigilância" !

A análise dos processo logísticos em busca de vulnerabilidades, o uso do Big Data, da Inteligência Artificial e a modelagem matemática auxiliarão no desenvolvimento de modelos resilientes da cadeia de suprimentos, permitindo assim, um adequado gerenciamento dos riscos dessa cadeia, criando-se alternativas para seu contingenciamento e mitigação da ocorrência de riscos e, por via de consequência, tornando essa cadeia global de suprimentos resiliente.

Fontes:
Gonçalves, P.S. – in Logística e Cadeia de Suprimentos – O Essencial – Editora Manole.
Harrigton, L. – in Operações Enxutas e Resilientes – O novo híbrido da cadeia de suprimentos do setor automotivo – DHL (2013).
Costas, F. H.; Da Silva, A.A.; Pereira, C.R. – in O que favorece a resiliência na cadeia de suprimentos? Insight a partir de uma revisão sistemática da literatura – Produção Online V.16, nº 3, p.916-946 – jul/set – 2016.
Taleb, N.N. – in A lógica do Cisne Negro – Editora Best-Seller (2015).
ATKaerney – in Digital Supply Chain : Increasing Critical for Competitive Edge – European A. T. Kearney/WHU Logistcs Study 2015.