CIÊNCIA e TECNOLOGIA
OS PERIGOS DO CAPITALISMO DE VIGILÂNCIA
O termo Capitalismo de Vigilância foi cunhado por Shoshana Zuboff
em sua obra denominada A Era do Capitalismo de Vigilância.
Em sua definição clássica, a autora o trata como uma maneira
unilateral de transformar a experiência humana em matéria-prima gratuita,
mediante sua tradução em dados comportamentais.
Diante desse quadro, embora os objetivos declarados das Bigs Tech
seja no uso desses dados como objetivo de aprimorar produtos e serviços, em
verdade ele vai mais além!
Ora, é notório que, em face da competividade exacerbada, esse
massivo banco de dados (Big Data) que pode incluir hoje, muitas vezes, dados biométricos
tais como: reconhecimento facial, batimentos cardíacos, movimento dos olhos,
rastreamento de sua movimentação através do GPS existente nos equipamentos
(celulares, tablets etc.), se transformam em um poderoso instrumento de predição
e mesmo, manipulação!
Por um lado, na predição, ao dar um “like” em um filme que um
indivíduo assistiu, no Netflix, por exemplo, ou mesmo em sua rotina de visitas
a determinados sites, esse processo alimenta os algoritmos de aprendizado que
passam a oferecer a esse indivíduo, tal qual um filtro em camadas, exatamente o
que o indivíduo gostaria de apreciar!
Essa convergência algorítmica funciona, exemplificando, tal qual o
lançamento de uma bola de ping-pong ao chão. Ela vai, em um processo de queda
gradual, reduzindo a sua altura na queda, até parar.
Nesse contexto, ouso dizer que esse processo de convergência é um
dos responsáveis pelo atual clima de intolerância e radicalização que estamos
convivendo em nossos dias!
Isso ocorre porque passamos a ver, ouvir e sentir cada vez mais
uma banda estreita das ocorrências, em face da convergência desses algoritmos
levar a um mundo imaginário de convivência em uma bolha de eventos que nos
tocam e sensibilizam.
Nesse processo os usuários passam a receber estímulos produzidos
por esses algoritmos, por apresentar sempre produtos e serviços na escala
preditiva baseada em seus comportamentos nas redes sociais etc. Assim, quando um
produto ou serviço for apresentado fora da sua “bolha de sensibilidade”, haverá
uma grande possibilidade desses indivíduos rejeitá-lo. Isso acontece por que,
de forma sub-reptícia, o algoritmo o capturou!
Por outro lado, a manipulação das pessoas ficou patente com o famoso
escândalo da Cambridge Analytica que, utilizando dados comportamentais dos
usuários do Facebook (Meta), promoveu uma massiva propaganda, especialmente
junto ao público jovem, para uma votação favorável ao Brexit (processo de saída
do Reino Unido da União Europeia que se iniciou em 2017).
Como bem descreve Zuboff: “...o capitalismo de vigilância é uma forma
nefasta comandada por novos imperativos econômicos que desconsideram normas
sociais e anulam direitos básicos associados à autonomia individual, os quais
são essenciais para a própria possibilidade de uma sociedade democrática”
(op.cit. pag.23).
Por exemplo, ao monitorar posts, fotografias, interações e atividades
realizadas na internet, os algoritmos do Facebook (Meta) podem deduzir “quando
um jovem se sente estressado, derrotado, nervoso, bobo, inútil ou fracassado” (op.
cit pag. 351); o que é muito perigoso!
Basta lembrar do regime chinês e sua vigilância totalitária, onde
milhões de câmera espalhadas por todos os cantos e acopladas à sistemas de
reconhecimento facial, vigiam e controlam a população nas mais diversas
situações; assim como estabelece um sistema de pontuação em função do
comportamento de cada indivíduo. Por exemplo, ao atravessar uma rua fora da
faixa de pedestre, não respeitar a sinalização para pedestres etc., um chines,
capturado pelo sistema de câmeras, imediatamente recebe uma pontuação negativa
que resultará em certas dificuldades em receber empréstimos, bônus do governo
etc.
Embora não estejamos em regimes totalitários como o chinês, o
certo é que as Bigs Tech nos controlam de forma audaciosa e furtiva, basta
examinar os recentes casos mundiais de censuras promovidas por seus algoritmos repressores,
projetados para captar palavras escritas ou faladas que, segundo seus
conceitos, representam uma ameaça ao “escopo” da plataforma.
Não é incomum um criador de conteúdo receber uma notificação de
que seu produto foi retirado da plataforma por “violar os princípios
norteadores desta plataforma”. Essa ditadura disfarçada acaba em muitas situações
cancelando a presença desse continuísta ou mesmo desmonetizando-o e, por via de
consequência impedindo de continuar operando nela, especialmente que muitos
sobrevivem desse tipo de serviço oferecido!
Cancelamentos de perfis de Twitters, Instagram, Youtube etc tem
sido um evento bastante corriqueiro em nossos dias. E a audácia vai mais longe
como foi o famoso caso do cancelamento da conta do Twitter do ex-presidente americano
Donald Trump e muitos outros, em todo o planeta e mais recentemente, aqui no
Brasil, numa atitude que afronta a liberdade de expressão, várias contas da
plataforma do Youtuber etc. e mesmo contas pessoais de grupos de WhatsApp foram
censuradas, apesar de tratar-se de conversação particular entre grupo de pessoa,
constituindo assim uma censura indevida!
A verdade é que quanto maior for o leque de conexões e inserções
nas redes, em grande medida agora com a implantação do 5G e operacionalidade da
internet das coisas, tudo estará conectado e, por via de consequência, será passível
de análise e controle.
Será que no futuro próximo teremos uma tecnocracia totalitária
controlada por algoritmos de inteligência artificial que passarão a vasculhar
as redes em busca de dados sobre cada cidadão e assim elaborando e avaliando suas
atitudes comportamentais?
“O diabo pode citar as Escrituras quando isso lhe convém!”
Shakespeare in O Mercador
de Veneza .
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