COMPLAINCE E SUPPLY CHAIN
A globalização ampliou consideravelmente
os mercados e disseminou práticas diversas nos mais variadas organizações
existentes no mundo. Nesse contexto brechas regulatórias internas das empresas
e mesmo procedimentos administrativos e judiciais de diversos países acabam por
permitir que indivíduos e mesmo empresas mal intencionadas, utilizem de
artifícios com objetivo de obter ganhos ilegais, causando danos diversos e
mesmo altos riscos para as próprias empresas, parceiras nos negócios e mesmo
aos clientes finais.
Um exemplo que teve uma grande
repercussão na mídia ocorreu recentemente: a manipulação do dispositivo de
controle de poluição dos carros a diesel fabricados pela Volkswagen. Essa
ocorrência começou a ser investigada pela EPA (Agência de Proteção Ambiental
dos EUA) a partir do exame das diferenças entre os níveis de emissão de gases
poluentes encontrados em testes operacionais e aqueles informados pela empresa.
O resultado dessa investigação, um
verdadeiro vexame para a montadora, produziu efeitos desastrosos, entre eles,
uma queda vertiginosa nas ações da Volkswagen, além de ter que admitir que esse
dispositivo alterava os resultados sobre emissões de poluentes, obrigando-se, por via de consequência a fazer
uma revisão em 11 milhões de veículos de várias marcas e espalhados por todo o
mundo.
Outro, não menos midiático, envolveu os
recentes escândalos de corrupção que tomaram conta da mídia no Brasil e no
mundo, muito especialmente o emblemático caso da Petrobras e suas relações
promíscuas com empresas cuja ética fora colocada de lado.
Outro exemplo, também bastante
emblemático, foi o escândalo da manipulação das taxas de câmbios, provocada
pelos bancos, entre eles: J.P.Morgan Chase, Citigroup, Bank of America, dos
Estados Unidos e os britânicos Barclays e Royal Bank of Scotland, e o suíço
UBS, que acabaram fechando, com Departamento de Justiça dos Estados Unidos e o
Federal Reserve (FED) , um acordo pelo qual serão multados em um total de 5,775
bilhões de dólares !
Esses exemplos demonstram, de forma
irrefutável, que prática de controles da organização deve ser implantada com a
maior urgência e em grande escala.
Os verdadeiros escândalos que passaram a
ser retratados na mídia, envolvendo grandes empresas, acabaram por alavancar a
urgência no uso de uma nova prática, que passou a fazer parte obrigatória de
todas as empresas.
Essa nova prática de controle passou a
ser disseminada nas empresas com a introdução de um programa denominado Complaince que na língua
portuguesa não tem tradução definida, mas que vem sendo incorporada ao jargão
dos negócios.
Essa palavra originária da língua anglo-saxônica
especificamente do verbo “to comply”
(cumprir), significa agir de acordo com as normas, regulamentos, procedimentos,
comando ou pedido, de maneira a que a empresa mantenha-se em conformidade com
as leis e regulamentos internos e externos.
Um programa de Compliance é desenvolvido
através de uma abordagem que permeia toda a empresa, suas relações internas e
externas, e está baseado nos oito elementos:
como mostra a figura 2.
- Responsabilidade empresarial;
- Monitoramento do ambiente regulatório;
- Políticas e procedimentos;
- Treinamento e conscientização de empregados e parceiros de negócios;
- Monitoramento e teste de controles;
- Realização de investigações;
- Gerenciamento de incidentes;
- Reporte para a alta gerência
como mostra a figura 2.
Figura 2 –
Programa de Complaince.
Fonte: Guia de Complaince - CADE (Versão preliminar)
Fonte: Guia de Complaince - CADE (Versão preliminar)
Dentro desse escopo, apresentamos a
seguir exemplo de alguns tópicos desenvolvidos em um programa de Complaince(1):
- Respeito à livre concorrência e às leis antimonopólio;
- Comprometimento com os resultados do negócio próprio, respeitando os direitos de terceiros e não aceitando a violação dos direitos da empresa;
- Ética nos negócios, não aceitando qualquer tipo de corrupção;
- Comprometimento com a sustentabilidade ambiental e preocupação com a saúde humana;
- Comprometimento com as leis do comércio internacional e as normas de importação e exportação;
- Transparência nos demonstrativos financeiros e fiscais;
- Comprometimento com a igualdade de oportunidades nas transações de mercado, não sendo permitido o uso de informações privilegiadas;
- Comprometimento com as autoridades no fornecimento de informações solicitadas de forma clara e completa;
- Comprometimento com as condições justa de trabalho, respeitando a igualdade de oportunidades sem discriminação de qualquer origem;
- Comprometimento com a integridade dos negócios, separando os interesses empresariais dos interesses pessoais;
(1) Adaptado de Bayer – Corporate Complaince Policy
No que se refere à cadeia de
suprimentos, o principal objetivo é mitigar todos os tipos de riscos, com a
finalidade de manter a continuidade dos negócios. Nesse sentido a transparência
na relação com os fornecedores, parceiros e clientes é essencial, assim como a
divulgação das características dos insumos e componentes fornecidos pela cadeia
de abastecimento e as práticas de sustentabilidade que também deverão estar
disponíveis para clientes e fornecedores.
Como comentamos em postagens anteriores, “A nova economia industrial
na era da sustentabilidade “ e “Block-chain e cadeia de suprimentos" , nas quais mostrávamos a preocupação do
consumidor quanto a origem do produto em todos os seus estágios de produção,
como por exemplo: a camisa que comprei
do fabricante “X” foi produzida com o uso de mão-de-obra escrava? O azeite que
adquiri em um supermercado efetivamente foi produzido dentro das boas práticas
da sustentabilidade e sem uso de produtos químicos? Será que os resíduos
originários de um processo produtivo recebeu um tratamento adequado conforme as
normas em vigor e a preocupação com a sustentabilidade?
Nessa direção, a União Europeia está
obrigando, por força de regulamentação, que as empresas forneçam mais
informações sobre seus produtos e serviços. Isso vai demandar uma mudança
considerável nos processos das empresas que deverão se tornar cada vez mais transparentes.
Prática essa, se não configurada, poderá sujeitar a empresa à perda seus
mercados ou mesmo sofrer punições elevadas das autoridades reguladoras.
Assim, uma maior transparência sobre as
cadeias de suprimentos, disponibilizando informações substanciais sobre os
produtos que são adquiridos pelos consumidores, além, é claro, facilitar o
controle dos processos por parte das autoridades responsáveis, torna-se
necessária.
Importante destacar que existem uma
série de obrigações de conformidade dos produtos que são reguladas por
instrumentos normativos expedidos pelos órgão governamentais ou normas
específicas e em razão disso é indispensável a reunião de esforços cooperativos
objetivando o detalhamento dos atributos de conformidade dos produtos.
É evidente que o conjunto de informações
elaboradas a partir desse processo vai variar em função do tipo de produto
considerado, por exemplo, alimentos, produtos químicos, produtos de higiene e limpeza, brinquedos etc.
Portanto, a captura de informações sobre
os insumos, matérias-primas, produtos acabados, seus processos, seu transporte
e mesmo as suas embalagens existentes nos diversos elos da cadeia de
suprimentos é um componente crítico para a realização de um adequado programa
de Complaince.
Assim, dentro dessa nova ótica de
transparência dos negócios evitaremos riscos e práticas inadequadas, criando
uma consciência empresarial voltada para o bem comum, além de atender, através
de um banco de dados, a demanda de clientes por informações sobre produtos e
serviços.
Fonte:
France Press - Volkswagen admite que 11 milhões de carros têm software
que frauda testes – disponível em http://g1.globo.com/carros/noticia/2015/09/volkswagen-admite-que-11-milhoes-de-carros-tem-software-que-frauda-testes.html
- acesso 08/02/2016.
El Pais in Multa de 17,5
bilhões de reais a seis bancos por manipular taxa de câmbio - http://brasil.elpais.com/brasil/2015/05/20/economia/1432083164_881791.html - acesso 09/02/2016
Portal de Complaince - http://www.portaldecompliance.com.br/sobre/?gclid=CM_dzZTi6soCFQGBkQod7ZwMkA.
Bayer – Corporate Complaince Policy – Bayer AG – Alemania - Edición en
español, diciembre de 2010.
CADE - Guia – Programas de Complaince – orientações sobre estruturação
e benefícios da adoção
de programas de complaince concorrencial - Versão preliminar.
ACREFI – Limites e responsabilidade do pessoal de Complaince – www.acrefi.org.br – acesso 09/02/2016.
Amber Road - Next Gen
PLM: Ensuring Compliance and Line of Sight Throughout Your Global Supply Chain
– White report – 2015.
Fourtrade – MANUAL DE COMPLIANCE FOURTRADE – disponível em http://www.fourtrade.com.br/ acesso 07/02/16.
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PAULO SÉRGIO GONÇALVES é engenheiro pela Universidade Federal do E. Espirito Santo, Mestre em Engenharia de Produção (M.Sc.) pela COPPE/UFRJ e MBA em Estratégia Empresarial pelo PDG/IBMEC; professor do IBMEC Educacional/RJ e autor das seguintes obras didáticas:
- Administração de Materiais - 5ª Edição - Editora Elsevier
- Logistica e Cadeia de Suprimentos - O Essencial - Editora Manole.
- Administração de Estoques - Teoria e Prática - Editora Interciência - em coautoria de E. Schwember.
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